Nos próximos 13 e 14 de agosto são esperadas milhares de mulheres que vão ocupar Brasília para marchar em contestação à precarização da vida. A 6ª edição da Marcha das Margaridas, que tem em 2019 o lema “Margaridas na luta por um Brasil com Soberania Popular, Democracia, Justiça, Igualdade e Livre de Violência”, reafirma a capacidade de articulação e força política das mulheres brasileiras em resistência frente a um governo que tem promovido um verdadeiro desmonte das políticas públicas, da previdência social, do meio ambiente e do Estado Democrático de Direito.
A Marcha que acontece à cada quatro anos tem esse nome em homenagem à uma lutadora do povo, a agricultora Margarida Maria Alves, líder sindical e defensora dos direitos humanos, assassinada nos anos 80 a mando de um latifundiário em Alagoa Grande, sertão da Paraíba. O tombamento de Margarida frente aos mandos e desmandos da violência do sistema capitalista é a inspiração que levará mais de 50 mil mulheres de diferentes regiões do país às ruas mais uma vez, mostrando o poder de revolução daquelas que são capazes de mover as estruturas de opressão que engessam as formas de ser e estar no mundo. Para Sílvia Camurça, da equipe do SOS Corpo, e que participa de perto da organização, a Marcha das Margaridas é um instrumento importante para o fortalecimento do movimento de mulheres no Brasil.
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“Para nós do SOS, a Marcha das Margaridas é a maior expressão de força do movimento de mulheres organizado. É, sem dúvida, a maior expressão da força das mulheres. A capacidade organizativa das trabalhadoras rurais sindicalizadas é enorme. Elas passam dois, três anos construindo, as Marchas são de quatro em quatro anos, nos intervalos elas fazem todo o trabalho político pedagógico. Então, a Marcha tem sido um instrumento do fortalecimento das mulheres rurais dentro do movimento sindical rural no Brasil”.
É esse caráter organizativo que fortalece a percepção da Marcha como instrumento político, porque ela não é apenas um ato de rua, mas a maior ação de mulheres da América Latina, uma grande mobilização que tem o objetivo de chegar no cerne das questões que atravessam a vida das mulheres e apresentar alternativas para modificá-las. De propor um outro projeto de sociedade que seja inclusivo, de preservação e manutenção dos territórios e de defesa da soberania popular, por uma educação não sexista e antirracista, de fortalecimento da agricultura familiar para uma alimentação sem veneno, e a garantia de acesso a um sistema de saúde gratuito e universal. A partir do diálogo e da apresentação de uma pauta de reivindicações era a forma como a Marcha se organizava até o golpe de 2016, quando a coordenação teve que mudar o ritual de organização para 2019.
“Esse ano elas não tem uma pauta de negociação como tiveram em outros, que a gente começava a acompanhar a negociação seis meses antes. Elas apresentavam aos Ministérios com as parceiras, a coordenação ia a vários Ministérios apresentando as reivindicações e quando a Marcha chegava em Brasília, o governo deva o retorno. Tanto o governo Lula, quanto o governo Dilma se encontraram depois da passeata para dizer daquela negociação o que é que ficou aprovado. Esse ritual não vai ter porque depois do golpe de 2016 a coordenação da Marcha concluiu que essa Marcha deveria ter um caráter diferente, um caráter de contestação e não de negociação. Porque não há o que negociar”, explicou.
A contestação, segundo Sílvia Camurça, é uma resposta aos avanços da política da extrema direita no país, tanto em aspectos econômicos quanto sociais, que tem levado a um empobrecimento da população brasileira, especialmente das mulheres.
“O governo extinguiu as políticas na área de agricultura familiar, a maioria. Esvaziou toda a área do Ministério do Desenvolvimento Agrário, colocou toda essa política dentro do Ministério do Agronegócio (Agricultura, Pecuária e Abastecimento). O Ministério do Meio Ambiente está acabado, tem toda resistência à política de demarcação de terras, é um governo que está sucateando o SUS, que tem promovido a violência contra as mulheres…então, para as trabalhadoras rurais e o conjunto da coordenação não há o que negociar. Há o que denunciar e o que contestar. Então esse é o espírito que leva essas 50 mil mulheres que chegarão em Brasília no dia 13 e marcharão no dia 14 fazendo manifestações e denúncias em relação aos ministérios, ao governo e ao próprio Congresso”.
Duas mil mulheres pernambucanas marcharão em Brasília
Num grande esforço de articulação do movimento sindical de mulheres, de diferentes organizações e entidades do movimento de mulheres e do movimento feminista, 41 ônibus sairão de diferentes locais do estado levando duas mil mulheres em comboios rumo a Brasília. De acordo com Joana Santos, militante feminista do Fórum de Mulheres de Pernambuco (FMPE) e da Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), há mais de três meses a articulação em torno da ida está sendo costurada junto aos processos preparatórios, tudo sendo coordenado pela FETAPE (Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado de Pernambuco).
“Há mais de 3 meses nós participamos de atividades preparatórias para ida das mulheres de Pernambuco para a Marcha. Sairão ônibus dos polos sindicais, de diferentes regiões do estado em comboios e tem um ônibus que é resultado de uma articulação que representa um dos eixos temáticos que serão discutidos durante a marcha, que diz respeito aos direitos sexuais e reprodutivos, de autonomia das mulheres sobre sua própria sexualidade e sobre seu corpo. Esse ônibus que está sendo chamado de Frente Feminista é representativo, uma vez que as mulheres que vão nele são representantes de vários movimentos e segmentos dentro do campo feminista e a Articulação de Mulheres Brasileiras está dentro desse processo”, explicou.
Ainda segundo Joana Santos, do ponto de vista político, o saldo da participação desde as atividades preparatórias até a ida à Brasília, para o campo feminista, é de fortalecimento da força e da capacidade de organização das mulheres do campo, das águas, das florestas, mulheres urbanas, periféricas, mulheres da arte, das universidades, em diferentes pólos de luta, o que dá a dimensão da força do movimento feminista.
Preparação político-pedagógica: os eixos da Marcha
Foram realizadas nos últimos meses em todo o Brasil, etapas de formação política. Em Pernambuco, as mulheres que estão indo para Brasília participaram de rodas de conversa e oficinas de preparação organizadas pela FETAPE e CONTAG (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares), com apoio de organizações do movimento feminista sobre as temáticas que compõem o sentido político e contestatório da Marcha que estão divididos em seis grande eixos: Por democracia com igualdade e fortalecimento participação política das mulheres; Pela proteção e conservação da sociobiodiversidade e acesso aos bens comuns; Por terra, água e agroecologia; Pela autonomia e liberdade das mulheres sobre seu corpo e sua sexualidade; Por previdência e assistência social pública, universal e solidária; e, Por uma educação não sexista e antirracista e pelo direito à educação do campo.
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“Nós realizamos um curso específico de preparação das mulheres com o objetivo de qualificar o debate em torno das políticas públicas, do reconhecimento delas enquanto poder organizativo que vai incidir diretamente no resultado da aplicação dessas políticas no campo, de reivindicar a realização delas e quebrar esse senso comum que o poder é só do governo. Isso é um saldo político importante, pois lá em Brasília elas se reconhecem enquanto um coletivo muito maior, veem as outras Margaridas de vários lugares do Brasil e voltam para as bases reconhecendo a força da luta das mulheres brasileiras”, comentou.
Para Adriana do Nascimento, Diretora de Mulheres da FETAPE, a dimensão da formação política-pedagógica é de extrema importância para se pensar a qualificação das mulheres que vão para a Marcha, mas, sobretudo, do reconhecimento delas sobre suas capacidades de causar impacto quando retornarem para a luta na base.
Adriana avalia positivamente o impacto da formação política-pedagógica em torno dos eixos temáticos da Marcha, porém salienta que não é apenas uma formação teórica, mas que a preparação tem o poder de ressignificar o sentido da luta dentro da base, uma vez que esses processos de reflexão permitem que as mulheres se reconheçam enquanto sujeitos políticos e de direitos.
“Foi muito importante e bonito de ver elas se reconhecendo enquanto feministas, compreendendo isso dentro do movimento sindical, mas também fora dele. O curso, que teve uma parceria fundamental com o SOS Corpo, trouxe o feminismo de forma simples, com uma linguagem do cotidiano explicações sobre como o patriarcado age junto a outras formas de opressão e como isso está presente no dia a dia. Então, foi uma reflexão do feminismo em suas vidas, trazendo a importância dessa identificação na luta das mulheres do campo”, avaliou Adriana.
“Mostrar para a sociedade que estamos todas juntas é a expressão da luta” – Joana Santos (FMPE)
A aliança entre os diferentes movimentos de mulheres do Brasil estará marcado pelos passos em Marcha. Tanto no dia 13 de agosto, com a integração de parte das Margaridas na 1ª Marcha das Mulheres Indígenas, quanto no dia 14, quando as mulheres indígenas vão se somar à Marcha das Margaridas, vai mostrar para a sociedade brasileira a força e a capacidade de articulação política das mulheres nas ruas em defesa dos territórios e da biodiversidade. Segundo Silvia Camurça, esses são dois temas que unem todas as mulheres que estarão em Marcha.
“Também nas cidades os territórios estão sendo invadidos pela capital imobiliário e a resistência pelo lugar de viver, seja com os povos indígenas, seja na periferia urbana, seja numa área rural, une a todas nós nessa hora. Um lugar pra gente viver e viver o nosso viver. Que não seja só o território visto como objeto de especulação e riqueza. Mas o território com seu espírito, sua cultura, sua gente, suas formas de produzir, suas formas de festejar, sua forma de conviver. Então é uma união em defesa dos territórios e das diversidades dos modos de vida. E isso é muito bonito. E é o mais simbólico e mais ameaçador para as forças que estão no poder agora”, concluiu.
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As mulheres ainda são revolução na organização, Administração porque somos protagonistas de nossas conquista lutas pelo esse país com ordem e progresso feminista viva a Marcha das Margaridas! Eu vou!!