Sentença do Tribunal Popular de Mulheres condena a proposta de Reforma da Previdência

Há bastante pressão no Congresso Nacional para que seja votada e aprovada a proposta do governo sobre a Reforma da Previdência (PEC 6/2019) antes do recesso dos parlamentares, que acontecerá de 18 de julho a 1 de agosto.

Manifestações contrárias não impediram votação na Comissão Especial

A votação final na comissão especial aconteceu na calada da noite do dia 03 de julho, na qual foi aprovado o relatório do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 6/2019. A primeira sessão foi realizada pela manhã, com grande presença da oposição e de movimentos sociais manifestando-se contra a aprovação da Reforma.

Vários movimentos se manifestaram publicamente contra a proposta. O movimento feminista realizou, a manhã do dia 3 de julho, o Tribunal Popular sobre a Reforma da Previdência, na Tenda dos Servidores, na Esplanada dos Ministérios. A ação foi organizada pela Articulação de Mulheres Brasileiras, Marcha Mundial de Mulheres, Movimento de Mulheres Camponesas, Articulação de Mulheres Negras e pela Federação Nacional de Trabalhadoras Domésticas. Depois de horas de testemunhos, o júri popular.

A sentença, com valor simbólico, foi lida após uma rodada de discussões entre as entidades na Esplanada dos Ministérios, em Brasília (DF), e considerou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 6/2019 injusta em sua integralidade.  Ao final do dia, representantes das participantes do tribunal fizeram um ato na Câmara dos Deputados para divulgar o posicionamento contrário à reforma.

À noite, entretanto, quando a Câmara de Deputados estava esvaziada, a Comissão Especial reuniu-se novamente e continuou o processo regimental, ignorando todas as expressões contrárias à Reforma por parte da população. O relatório foi aprovado na manhã do dia 4 de julho e seguiu para o Plenário do Congresso Nacional.

Conheça a sentença condenando a Reforma da Previdência

Os Tribunais de Mulheres são processos e caráter ético-político e simbólico propostos para sensibilizar e chamar a atenção para os danos sofridos por mulheres em várias esferas da vida. Do ponto de vista ético, o testemunho significa respeito pelas experiências vividas, solidariedade para com aqueles que tornam visíveis e denunciam ao público todo sofrimento, afetação pessoal e coletiva e alternativas de resistência. O ato de testemunhar pressupõe credibilidade e fidelidade à realidade, expressando que a história de uma pode ser a de muitas mulheres.

Nesta edição do Tribunal, foi julgada a proposta de contrarreforma da previdência PEC 06/2019, sua versão original e o parecer do relator. Mulheres de diferentes movimentos de trabalhadoras e feministas analisaram a proposta de reforma da previdência e testemunharam sobre seus impactos na sua situação de vida e trabalho, no campo, nas cidades, nas floresta, nas águas e nas casas, sustentado a reprodução social. Baseadas nestas experiências, especialistas na área do direito do trabalho e nos estudos sobre as mulheres no mundo do trabalho, julgaram e apresentaram o seu veredito sobre a proposta de contrarreforma da previdência. As vozes das mulheres, suas experiências de trabalho e resistência, foram a matéria para o julgamento, ético e político, desta proposta de reforma.

Rosângela Piovizani Cordeiro, do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) testemunha sobre a situação das  mulheres camponesas:

“A Medida Provisória 871 retira o poder dos sindicatos de garantir o reconhecimento e comprovação da atividade rural.  A MP 871 autoriza que o perito ganhe bônus para retirar e restringir direitos das mulheres. Essa reforma amplia o tempo de atividade rural e institui a contribuição. As camponesas vivem de colheitas anuais. Em alguns anos, pela seca ou pela chuva, não se colhe, não se tem renda, o que inviabiliza a contribuição. A  desvinculação significará perda do poder de compra e de uma parâmetro, agravando a situação que hoje já é de não existência de aumento real. É muito grava retirar o princípio da constitucionalidade como um princípio básico. A desconstitucionalização abre a previdência pública para a capitalização. A maioria que terá condições de garantir aposentadoria pela capitalização, são homens, dos setores mais abastados.  A reforma joga nós mulheres da classe trabalhadora à margem da sociedade. Se a gente não impedir a reforma, o cenário é de morte e suicídio. A reforma irá atingir a manutenção e a sobrevivência dos pequenos municípios. O fundo municipal é ínfimo frente aos recursos movimentados pela previdência social. O comércio se movimenta porque aposentados e aposentadas sustentam a economia local. Paulo Guedes é mau economista, porque sua proposta vai quebrar os pequenos municípios brasileiros.  A reforma vai aumentar a pobreza e a miséria. Na velhice, temos necessidade de uma alimentação mais adequada. Com os benefícios reduzidos, e o SUS enfraquecido, as mulheres serão mais pobres e e mais adoecidas. Com a resistência das mulheres camponesas, do campo, das florestas e das águas, ajudamos a construir os direitos e a previdência. Estivemos juntas no fórum itinerante em luta, juntas, contra a proposta de 2007, fizemos greve de fome contra as medidas de Temer e estamos fazendo as brigadas loiva em Brasília há 12 semanas fazendo resistência. Vamos a todos os lugares resistir pela dignidade do campo.  Vamos denunciar, vamos às ruas e vamos dar as contas a qualquer parlamentar que votar nessa maldita reforma. Nos mantemos vigilantes e articuladas com as mulheres, como classe trabalhadora, em defesa da previdência pública, universal e solidária. A previdência é nossa, ninguém tira ela da roça!”

Francisca Pereira, do Movimento Interestadual de Quebradeiras de Coco Babaçu, de Codó, Assentamento do Maranhão, quebradeira de coco, mãe e filha, testemunha sobre a situação de trabalho das mulheres quebradeiras de coco:

“Nós que quebradeiras de coco produzimos os alimentos. Nós contribuímos, trabalhamos no campo, preservamos o meio ambiente, com nosso jeito de trabalhar, guardamos as florestas e os babaçuais, lutamos contra o latifúndio. Essa reforma da previdência vem para dificultar a nossa vida.  Nossa vida é sofrida, temos vantagens e desvantagens de morar no campo. Não conseguimos acessar mais as políticas públicas, estamos perdendo direitos. A vida na base está mais difícil. Hoje a gente contribui 15 anos. Com a reforma, vamos contribuir mais tempo ainda. Nem sabemos se vamos ter o direito à previdência garantida. O movimento está fazendo debates e está se fortalecendo como mulheres unidas.  Só quem sabe, só quem mora no campo, quando a gente vai pro mato quebrar nosso coco debaixo da palmeira, estamos no coletivo conversando e trabalhando, escutamos as mulheres. O que a gente sabe fazer de melhor na nossa vida é quebrar o nosso coco. Nosso depoimento traz nosso compromisso de lutar para que a reforma não seja aprovada. Nós quebradeiras de coco dizemos não à reforma da previdência”.

Vilmara do Carmo, do Sindicato das Professoras do DF, testemunhou sobre a situação das trabalhadoras da educação. Testemunha a dura realidade das condições de trabalho da educação pública no nosso país. Testemunha a sobrecarga e longas jornadas: trabalhamos nas escolas e levamos trabalho para casa. Testemunha o desgaste físico e emocional do trabalho na educação infantil e fundamental. 

“Nosso trabalho na sala de aula na educação infantil temos até 26 crianças de 04 a 05 anos numa sala de aula para uma professora sozinha, sem assistentes. As primeiras habilidades de consciência social são feitas na escola. Aprender a ouvir, a interpretar, a se relacionar: tudo isso é repetido pelas professoras várias vezes numa sala de aula, de manhã e de tarde. Trabalhos com o princípio da inclusão e temos que lidar com as diferenças na sala de aula. Não há monitoria. As professoras têm que dar conta sozinhas de todas essas singularidades.  Quando as crianças têm mais autonomia, nós falamos e nos movimentamos mais. Usamos nossa voz, é nosso instrumento de trabalho. Nossa estrutura física, voz, braços e colunas, são usadas numa aula. Não há instrumentos de trabalho: sem som, sem recursos audiovisuais. Tudo é concentrado no corpo da professora. Com o empobrecimento massivo, as crianças vão pra escolar se alimentar. O objetivo da escola se perde diante da pobreza e da fome. A rede socioassistencial não dá conta de atender os problemas. Professoras sabem de situações de violência e abuso e não há retaguarda. Isso gera adoecimento grave na categoria. No ensino fundamental, a situação de sobrecarga é grande. Uma professora dá conta de 300 a 400 estudantes por ano.  Não é possível nem decorar o nome dos alunos e alunas. Lutamos por mais escolas, mais salas de aula. Pra garantir um atendimento mais individualizado. 

Estou fazendo esse relato para mostrar porque a aposentadoria de professores e professoras é um diferencial. Nossas condições de trabalho, das professoras brasileiras, são precárias. Enquanto as condições forem essas, não podemos aceitar aumentar o tempo de contribuição, nem de idade, para acessar a aposentadoria. O fracasso recai nos ombros das professoras. A consequência é o adoecimento das nossas docentes. Temos alto percentual de professoras readaptadas, adoecidas. Não aceitamos a reforma da previdência, PEC 06. Essa proposta é injusta. Primeiro, porque estamos pagando uma conta que não é nossa, é dos banqueiros.  Segundo, nós não damos conta: com 50 anos de idade, é impossível encontrar uma companheira que trabalhou 25 anos de idade sã, com saúde para trabalhar, ainda mais nessas condições. Nós professoras não aceitamos a PEC 06. Não temos condições físicas, sociais e psicológicas de trabalhar depois dos 50 anos de idade. Seguiremos defendendo a nossa aposentadoria especial”.

Brenda Marques e Liliane Carvalho, da Articulação de Mulheres Brasileiras, testemunham sobre a situação de desproteção social das mulheres na juventude e na informalidade, nas grandes cidades e pequenos municípios do interior.

Brenda Marques: “Nós da AMB somos plurais, do campo e da cidade.  A maioria de nós é trabalhadora informal. Eu trabalho desde os 16 anos de idade, como jovem aprendiz, e depois fazendo tranças, vendendo produtos através de revistas, na informalidade.  A juventude LGBT, meus amigos e amigas, está na informalidade, nos centros de telemarketing, superexploradas. Imaginem como a juventude vai arcar com a capitalização? Como vamos contribuir? Já entramos com insegurança. Nos acomete a insegurança, a depressão.  Estamos sem perspectiva de futuro. Temos um alto índice de suicídio na juventude. Nós da AMB defendemos previdência para todo tipo de trabalho, para todas as mulheres que trabalham, inclusive as que estão na informalidade. Não queremos a reforma da previdência”.

“Eu sou Liliane, sou de um município bem pequenininho, Viçosa do Ceará, um município pequeno em que muitas vivem no campo. Estou aqui para dizer que esta reforma atinge a nós mulheres, trabalhadoras rurais. Na minha cidade, quando sai a aposentadoria, o comércio se movimenta. As mulheres gastam toda a sua aposentadoria no comércio. Mexer com a aposentadoria das trabalhadoras rurais é mexer com a economia dos nossos municípios. Não só o comércio, mas também o transporte se aquece com a movimentação das trabalhadoras rurais para a cidade. Na minha cidade, no interior, as mulheres estão na informalidade. Não tem acesso a emprego. Trabalhamos desde muito cedo e por toda a vida sem direitos. Depois do golpe, que retirou direitos, no interior, aumentou o número de mulheres com sua banquinha e carrinho vendendo na rua, mulheres que para manter suas famílias trabalham como manicure, faxineira, em busca de emprego.  Esse trabalho precário torna a vida mais difícil hoje, mas também compromete seu futuro. Como uma mulher na informalidade pode garantir sua previdência? Emprego com carteira assinada só no tempo de eleição. As prefeituras só oferecem emprego temporário. Nós mulheres somos as que mais sofremos. Na minha cidade o emprego doméstico existe, as mulheres trabalham o mês inteiro para ganhar 400 reais. A lei ainda não chegou em Viçosa. As mulheres que estão na informalidade são negras, para sermos antirracistas, precisamos lutar essa reforma. Essa reforma não respeita nossos direitos, não enfrenta a desproteção social. As mulheres que estão na informalidade geram riqueza. A maioria daquelas que estão aqui ao nosso redor são mulheres. É justo que as mulheres que garantem a reprodução social sejam esquecidas? Queremos que a riqueza que a gente produz e não é pouca sejam destinadas às pessoas humanas, à classe trabalhadora, não aos bancos. Reafirmamos o compromisso da AMB, da qual faço parte, como Movimento Ibiapano de Mulheres, como Fórum Cearense de Mulheres, contra essa reforma é ilegal, imoral. Nem a PEC original, nem os remendos que estão sendo costurados. Nenhum passo atrás, nenhum direito a menos.  Queremos uma previdência universal, que garantem direitos para todas as mulheres”.

Creuza Oliveira, da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas – FENATRAD:

“Nós trabalhadoras domésticas somos 6 milhões de trabalhadoras, a maioria mulheres negras, que hoje já temos muita dificuldade de ter acesso à previdência. Somos contra essa reforma, que para nós deforma o sistema de previdência. Como categoria, temos direito à carteira assinada há 46 anos. Direito à previdência também há 46 anos. Mas a maioria está na informalidade, sem previdência social. Somos chefes de família, mães solteiras, que cuidam de seus filhos e filhas, com menos de um salário mínimo. Eu já vi em Salvador uma trabalhadora ganhando 200 reais há 10 anos numa mesma casa. As trabalhadoras domésticas são violadas nos seus direitos, sofrem assédio sexual e moral no seu local de trabalho. As diaristas são mais precarizadas. Muitas trabalhadoras domésticas precisam vender produtos de beleza para as multinacionais, sem direitos, sem regulamentação, sem pagar os direitos. Essas trabalhadoras domésticas ainda vivem em situação de desigualdade. Tivemos avanços importantes com o Governo Lula e Dilma, com a EC 72 e a Lei 150/2015, mas infelizmente, com a reforma trabalhista, estamos perdendo esses direitos. Os direitos perdidos enfraquecem o nosso movimento sindical. Dizemos não a essa PEC 06. O presidente, machista, homofóbico, intolerante, não está preocupado com a classe trabalhadora. Estamos aqui para dizer não a essa reforma. Estamos fazendo abaixo-assinado, palestras, conversando com a classe trabalhadora, estamos dizendo não à reforma previdenciária. Conquistamos direitos com luta e organização. Não podemos perdê-los, não vamos abrir mão dos nossos direitos. Não podemos desanimar.  Precisamos continuar na luta. Sem luta, não há vitória”.

Cleusa Aparecida, da Rede Nacional de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras.

“O que está na pauta do governo federal não é reforma. Quando a gente faz reforma na casa, a gente melhora a casa. Como você faz uma reforma na sua casa destruindo o alicerce? Não é uma reforma, é o fim da aposentadoria, é o desmonte do sistema de seguridade social, é jogar todo mundo na miserabilidade permanente. Nós mulheres negras ainda estamos lutando para acessar esse sistema. Na constituição de 1988, nós conseguimos vários direitos. A partir dos anos 1990 começa o desmonte, o processo desconstituinte permanente, com as reformas de FHC. De lá pra cá são PEC, são leis, para destruir nossos direitos. Hoje nós temos um governo subserviente e entreguista que quer acabar com a soberania nacional. Dizem que essa reforma é necessária porque estamos em crise. Nosso país não está em crise, o que gera crise no capitalismo é a quebra do sistema bancário, que o Brasil não teve, catástrofe, guerra e outros fatores. Nenhum deles nós estamos vivendo no Brasil. O problema é que o tesouro nacional está remunerando o sistema bancário pagando juros da dívida pública. Estamos pagando quatro vezes a dívida pública. A crise não é na previdência, é no sistema financeiro. Nós mulheres temos que ir pra cima do sistema bancário, lutar contra os juros absurdos, lugar com os setores que o sistema bancário é suicida. Por justiça redistributiva, dizemos não a esse governo. Como fala em moralidade temo Moro como ministro? A reforma está retirando também direitos do trabalho e direitos trabalhistas. O que mata o povo é o sistema o capitalismo, o racismo, o machismo, no mundo. Nós temos que destruir esses três sistemas. Se um governo quer de fato colocar o dinheiro no caixa, acabe com a DRU, taxe as grandes fortunas, taxe as exportações, mude o sistema regressivo de impostos, enfrente a sonegação. Vamos denunciar a corrupção do sistema privado! Nenhum direito a menos, fora Bolsonaro! Não há moralidade em um governo cheio de corruptos e assassinos para mexer na previdência pública”. 

Testemunhou pelas mulheres da CONTAG, Edjane Rodrigues, da Secretaria de Políticas Sociais da CONTAG, denunciou o desmonte social que significa a reforma da previdência nos espaços da sociedade.

“Quero dizer que o discurso de que os rurais estão fora dessa reforma é mentira. Isso é tentativa de desmobilizar os trabalhadores e trabalhadoras rurais. A proposta prejudica a produção de alimentos saudáveis, gera êxodo rural e impactar a economia dos municípios. Ainda que estivessem resguardados os nossos direitos, a gente faria essa luta, porque nossa luta é de classe, não é de categoria. Os avanços que nós tivemos se deu como resultado de nosso protagonismo. Construímos unidade das mulheres desde o mês de março na luta contra a reforma da previdência. Seguimos resistentes, mobilizadas.  Temos algo que levará à derrota dessa proposta de reforma: adiar a reforma para pós-recesso. Em agosto, teremos a força da marcha das margaridas para dar um recado a esse governo que não tem nos representado e um não à reforma da previdência”. 

Isabel Freitas, da Marcha Mundial de Mulheres, testemunha sobre o desmonte da previdência como parte da atual fase do capitalismo, que avança se apropriando de nossos diretos.  

“Vimos a tragédia no estado de Minas Gerais. As escavadeiras do capitalismo avançam no Rio Grande do Sul. O capitalismo caminha para o final de um processo de absoluta usurpação dos nossos bens comuns. Nesse momento de ofensiva do capitalismo internacional e nacional se dá sobre os direitos de manutenção da nossa vida. Isso inclui a reforma trabalhista, a precarização da classe trabalhadora, que foi avassaladora sobre os direitos humanos de todas as populações. Está em curso uma política de desmonte das políticas que garantem dos direitos dos povos indígenas, quilombolas. O capitalismo está em um momento de aniquilamento da vida das populações. Esse governo ganhou as eleições na base da mentira e da corrupção graúda dos fake news, do dinheiro sujo, e da corrupção miudinha. O governo corrompe o servidor público ao oferecer 59 reais a um profissional para retirar direitos da população. Ele não ganhou na classe trabalhadora, porque quem votou, votou enganado. A marcha mundial de mulheres debate que a reforma da previdência como parte desse momento do capitalismo, momento que gera morte. A reforma da previdência vai vulnerabilizar ainda mais a vida das pessoas idosas. O índice de violência do idoso só diminuiu por conta da renda da previdência. Se a proposta for aprovada, vai aumentar a violência contra as mulheres rurais. Esse momento do capitalismo é precarização e extermínio da vida dos pobres. Estamos nos organizando, mostrando para o movimento sindical que existimos e somos diferentes, organizando a resistência e a organização local, debatendo e discutindo a precariedade do momento que estamos vivendo”. 

Testemunhos ouvidos na Tribuna Livre

Leila Rebouças, Promotora Legal Popular, testemunhou sobre pontos obscuros da reforma: “a militarização das escolas é impulsionada pela reforma; a reforma criminaliza e precariza a prática pedagógica e o trabalho de professores e professoras; impacta e impede a universalização pública e laica. É grave o que pode vir a acontecer. O mundo do trabalho é estruturado por desigualdades de gênero e questão geracional: quando a gente é jovem, o mundo do trabalho não nos acolhe quando a gente pare. Quando somos mais idosas, só o fato de ter um cabelo branco nos discrimina no mundo do trabalho, porque acham que não temos mais capacidade de produção e só nos resta o trabalho informalizado, sem nenhuma garantia, e o trabalho de cuidado das pessoas da família. Estou desempregada há 05 anos, sou professora, mas não posso trabalhar porque tenho que cuidar da minha mãe que tem alzeheimer. Isso não é justo. Essa é a situação que nós temos já sem a reforma.  O que vai acontecer depois da reforma da previdência? Vamos continuar sendo discriminadas, criminalizadas, sem nenhum apoio para viver dignamente”.

Claudete, da Frente Unificada da Cultura e do Movimento de Mulheres do Audiovisual: “Nós mulheres da cultura que estamos no trabalho precário e informal, sequer almejamos entrar no sistema de previdência. Estamos num momento de extrema precariedade em relação à previdência social e estamos em luta com os demais movimentos de mulheres, fortificando trincheiras, e nos fortificarmos como classe e gênero para que possamos juntas combater e vencer a luta contra a reforma da previdência”. 

Graça, a Associação de Juristas pela Democracia: Esta reforma é uma proposta de miséria da fome, da morte, proposta pelo desgoverno Bolsonaro. O que está hoje posto para nós não é outra coisa que não seja rua, rua, fora Bolsonaro. O ex-juiz, hoje Ministro, estava no congresso nacional com a maior cara de pau e descalabro.  Nós precisamos estar na rua contra este desgoverno”. 

Clarete,  do Movimento Sem-Terra: “Sou pré-assentada na Brasilândia, na luta há 11 anos e vivendo o descaso do governo no encaminhamento da documentação. O governo também probiu cavar poços e cortou o abastecimento com carros pipas. O governo não está nem aí pra nossa situação. Eu tenho 34 anos e me preocupo, pretendo me aposentar como trabalhadora rural, e me preocupo muito. Esse governo não está nos representando.  É um governo frio. Sem feminismo, não há socialismo”.

Igina, Fóum de mulheres da Amazônia Paraense:Estamos na Amazônia reinventando uma luta chamada empate. Nós queremos empatar o neoliberalismo, as políticas de desmonte e a reforma da previdência. A proposta de reforma ameaça nossa vida e nosso bem viver. Somos unidas pela força e pela vontade de lutar juntas”.

PORTANTO, CONSIDERANDO QUE:

São as mulheres estão mobilizando o debate local e democrático, ouvindo e dialogando com a população sobre a reforma da previdência, o que o governo não está. Baseada na fidedignidade de seu testemunho, sua experiência e sua resistência, o júri, formado por Ana Cláudia Rodrigues Bandeira Monteiro (Procuradora do Trabalho e Diretora da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho); Luana Pinheiro (Economista, Doutora em Sociologia pela Unb e especialista em gênero, trabalho remunerado e não remunerado e políticas sociais) e Elisa Aníbal (Advogada feminista, Pernambuco).

O JÚRI DO TRIBUNAL POPULAR SENTENCIA QUE:

Primeira jurada: Ana Cláudia Rodrigues

  • A reforma da previdência não pode ser considerada desvinculada da reforma trabalhista e seus impactos. A reforma trabalhista manteve as pessoas desempregadas e levou as pessoas a ficarem mais desanimadas. Levou mais gente à informalidade. Trabalhadores e trabalhadoras vivem em angústia;
  • A reforma representa a supressão do direito à aposentadoria para as mulheres, um dos pilares do sistema de proteção brasileiro e esperança para trabalhadores e trabalhadoras;
  • A reforma da previdência é uma falsa promessa. A proposta da reforma trabalhista gerou expectativa de salvar a economia. Não foi assim. Quem defende a reforma da previdência proposta, promete que ela vai salvar a economia. Os depoimentos das mulheres mostram o contrário. A proposta levará a mais desproteção, maior empobrecimento, perdas para as economias locais;
  • As mulheres, com seus depoimentos, questionam as informações confusas e enganosas divulgadas pelo governo de que a reforma é uma solução;
  • A reforma da previdência tal como proposta significa uma afronta ao estado democrático de direito e viola um princípio constitucional de assegurar direitos para enfrentar pobreza e desigualdade A proposta, se aprovada, aprofundará pobreza e desigualdades, principalmente para as mulheres;
  • A proposta de reforma da previdência não tem fundamento legal, constitucional e social para ser aprovada.

Segunda Jurada, Luana Pinheiro:

  • As mulheres são um grupo especialmente atingido pela reforma em todas as suas versões, original e relatório;
  • A ideia de uma reforma da previdência sempre trazida pelos governos é apresentada como saída para reduzir gastos e apenas pela lógica do gasto. Não se toca na questão da receita: o desemprego, a reforma trabalhista, o enxugamento do estado, reduz receitas do Estado para prover direitos. O que é preciso não é reduzir despesas retirando direitos, é aumentar receitas para ampliar direitos e proteção social;
  • As mulheres contribuem para as futuras gerações todos os dias, fazendo e garantindo a reprodução social no âmbito das famílias. Essa já é nossa grande contribuição para a sociedade brasileira;
  • A proposta atual e o relatório nos coloca permanentemente em reforma por meio da desconstitucionalização. Estabelece insegurança e instabilidade jurídica porque permite alterações por leis complementares. O discurso de que medidas como capitalização foi retirado é falacioso: porque se a desconstitucionalização for aprovada, todos os mecanismos hoje retirados podem ser reintegrados; 
  • É preciso manter o sistema solidário de previdência social que garanta proteção a cada trabalhador e trabalhadora desse país.

Terceira jurada: Elisa Anibal

  • A deforma da previdência acaba com a ideia constitucional de bem viver da população. Ela afeta a saúde integral e universal, pois impacta a expectativa de vida da juventude, gera adoecimento e prejudica a saúde física, integral, mental da população trabalhadora, principalmente das mulheres;
  • Viola tratados internacionais que estabelecem que todas as pessoas são iguais perante à lei, mas com equidade. As mulheres têm uma dupla jornada de trabalho. As mulheres arcam com o trabalho produtivo, reprodutivo, desregulamentado, e mantém nossa sociedade de pé. Igualar a idade para a aposentadoria, não é gerar igualdade. É gerar mais desigualdade;
  • A maioria das mulheres está na informalidade e a proposta de reforma não enfrenta, antes aumentará, a desproteção social das mulheres;
  • As mulheres entram e saem do mercado de trabalho para realizar o cuidado de pessoas adoecidas e isso afeta o seu salário, rebaixa seus rendimentos e reduz sua capacidade contributiva. A proposta de forma gerará maior dependência, subordinação das mulheres nas famílias, poder patriarcal sobre as mulheres, vulnerabilidade à violência. Reduz a autonomia das mulheres.
  • A proposta deste governo revela o descaso com a vida das mulheres e revela o interesse com o capital como motor da reforma da previdência.

Leitura da sentença na Subcomissão Especial da Seguridade da Mulher

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