Audiência na ALEPE acata denúncias do Tribunal Popular das Mulheres das Águas

A Audiência, convocada para discutir condições dignas de vida e de trabalho para as pescadoras artesanais de Pernambuco, recebeu documento com denúncias e a sentença do Tribunal das Mulheres das Águas, realizado pela Articulação Nacional das Pescadoras

|Texto e Fotos: Fran Ribeiro – Comunicação SOS Corpo |

Na tarde do dia 24 de abril, o auditório Sérgio Guerra, da Assembleia Legislativa de Pernambuco, ficou lotado com as mais de 150 pescadoras artesanais que saíram do Tribunal Popular e foram participar da Audiência Pública convocada pela Comissão de Cidadania e a Comissão de Meio Ambiente, em conjunto com os mandatos das parlamentares Rosa Amorim (PT), Dani Portela (PSOL) e do deputado João Paulo (PT). 

A Audiência foi convocada para discutir condições dignas de vida e de trabalho para as pescadoras artesanais de Pernambuco. Dos órgãos públicos convocados, apenas a Secretaria de Desenvolvimento Agrário e Pesca do Governo estadual mandou representante. No âmbito federal, apenas o Ministério da Pesca e Aquicultura esteve presente com uma representação. Não mandaram representantes o Ministério Público de Pernambuco, Ministério da Saúde, INSS, Superintendência do Patrimônio da União e Secretaria Estadual do Meio Ambiente. 

A deputada ]Dani Portela abriu as falas no púlpito. A parlamentar começou dizendo da ineficiência do governo do estado em garantir melhores condições de vida para as pescadoras e suas famílias. Ela deu como exemplo do descaso, o fato de que a Lei Orçamentária Anual proposta pelo Governo de Pernambuco não tem verba prevista para investir em políticas públicas voltadas para as pescadoras. Outra falta de resposta evidenciada por Dani foi a inexistência de ações e políticas da Secretaria da Saúde para reconhecer doenças recorrentes do trabalho que acometem pescadoras artesanais, sobretudo pelo contato direto com águas contaminadas. 

Rosa Amorim, deputada estadual pelo PT, destacou o desafio que as pescadoras enfrentam em territórios ameaçados por grandes empreendimentos, a situação de vulnerabilidade que a especulação nos territórios pesqueiros coloca sobre mulheres e jovens, que se sentem impedidas de ir trabalhar. Há ainda o avanço sobre o território quilombola que abrange o Rio Tatuoca, no município do Cabo de Santo Agostinho. O Quilombo das Mercês ainda não foi demarcado, o que aumenta o assédio dos empreendimentos naquela região próxima ao Porto de Suape e que faz parte do projeto de expansão do Porto. 

Governos Federal e Estadual tentam responder às demandas da Audiência 

Diogo Nunes, da Secretaria Nacional da Pesca Artesanal, do Ministério da Pesca e Aquicultura, resgatou o processo de sucateamento das políticas do Governo Federal voltadas ao fortalecimento da pesca artesanal desde o golpe de 2015, o impacto da extinção do Ministério da Pesca nos governos golpistas de Temer e Bolsonaro e ampliação e alta do investimento de recursos públicos por esses governos à pesca industrial, com a consequente desvalorização e queda de recursos voltadas para os territórios e comunidades pesqueiras. 

Nunes trouxe ainda informações sobre iniciativas do governo Lula, como o programa federal Povos da Pesca Artesanal, que visa a elaboração do Plano Nacional da Pesca Artesanal, processo que envolve a escuta de pescadoras e pescadores de todo o Brasil e que deve resultar em políticas públicas destinadas às necessidades das comunidades pesqueiras. Já foram realizadas sete planárias em diferentes regiões do país e em agosto deste ano, está prevista a realização de uma grande plenária nacional, em Brasília. A ideia é que o Plano defina propostas para a pesca artesanal no Brasil pelos próximos 10 anos. Segundo Diogo Nunes, o orçamento do Ministério da Pesca e Aquicultura é de R$ 270 milhões, o que representa muito pouco diante das demandas da pasta. 

Sobre a pauta da saúde, o representante informou que uma parceria firmada entre o Ministério da Saúde com a FioCruz está oferecendo cursos de formação de agentes de saúde para atenderem de maneira mais qualificada as comunidades pesqueiras em suas necessidades. Diogo Nunes deu devolutivas sobre as dificuldades em relação ao Registro Geral da Pesca e do sistema PesQBrasil, programas digitais de cadastramentos de informações e que muitas vezes apresentam erros na execução. O representante do governo federal disse que as atualizações e melhorias dos sistemas estavam sendo providenciadas. 

Já Josimar Gurgel, da Secretaria de Desenvolvimento Agrário e Pesca do governo de Pernambuco, estava representando esta e outras Secretarias. Ele destacou ações em que o governo estadual é contraparte com o governo federal, ou seja, ações em que o governo brasileiro aporta mais recursos do que o governo do estado. As ações são na área de desenvolvimento socioeconômico, como beneficiamentos de pescados e produção de artesanato com conchas de ostras e sururu. Na área da saúde, o representante do governo Raquel Lyra não trouxe nenhuma informação. 

Pescadoras reagem a falta de resposta do governo de Pernambuco

Na abertura das falas ao plenário, várias pescadoras se manifestaram, mostrando o descontentamento das mulheres com a ausência de representações dos governos e com a falta de propostas concretas de melhoria para pescadoras e os territórios pesqueiros. 

“O governo nos escuta, mas a resposta não nos corresponde. Sou moradora do Cabo e lá os empreendimentos surgem com aval do governo e não há uma consulta onde a gente possa dar nossa opinião. Daí temos territórios impactados com aterramentos. Nós não somos contra o desenvolvimento, mas queremos ser ouvidas. Quando vemos o empreendimento já está lá. Eu quero que meus netos alcancem a natureza. A gente não é contra o desenvolvimento, mas queremos garantir o território pesqueiro e nosso direito de ir e vir”, se posicionou Aparecida Santana, pescadora da Região Metropolitana de Recife. 

Uma preocupação recorrente das mulheres é sobre o impacto da precarização da vida nos territórios pesqueiros sobre a juventude. Foi nessa perspectiva que Joana Franco, pescadora do litoral sul, conduziu sua fala. “Estou aqui representando a juventude da pesca artesanal e eu quero dizer que existem jovens sim pescando, tanto homem quanto mulher. Queremos mais espaço, eu peço para o estado olhar para nós, enquanto juventude. Somos povos originários também. E cadê o estado? Queremos ação, projetos, meios para nós jovens pescadores. Queremos continuar nos nossos territórios e para não sairmos deles, precisamos de incentivos dos governos”, destacou a jovem, que foi aprovada no ENEM e é caloura de ciências biológicas na UFPE. “Eu consegui entrar na universidade e o meu incentivo foi o projeto Jandaíras, que me possibilitou ficar em casa, estudando todos os dias e conseguisse passar”, reforçou Joana. 

A Audiência foi finalizada com a leitura dos encaminhamentos, entre elas: a criação de uma política de saúde voltada para as pescadoras artesanais, com atendimento especializado e o reconhecimento das doenças laborais das pescadoras; elabora políticas de incentivo à juventude pesqueira, promovendo educação, geração de renda e adoção de práticas sustentáveis, visando o fortalecimento da juventude e das comunidades; desburocratização do acesso ao Registro Geral da Pesca; revisão da legislação do seguro-defeso; exigir do governo do estado a distribuição permanente de equipamentos de proteção, como protetor solar, luvas, camisas UV e outras ferramentas necessárias para o trabalho das pescadoras; revogar a legislação que ataca a identidade pesqueira e que impactam o acesso aos direitos previdenciários como a aposentadoria e seguro-defeso; e cobrar maior compromisso da prefeitura de Ipojuca com a mediação do conflito em Maracaípe. 

As mandatas das deputadas Rosa Amorim, Dani Portela e João Paulo se comprometeram em acompanhar os encaminhamentos e mediar os diálogos em favor da luta das pescadoras artesanais de Pernambuco.

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