Por Carmen Silva*
Quem viu as ruas nas últimas manifestações não tem como negar. As mulheres estão dando o tom da revolta popular nesta conjuntura. A ânsia no estômago que estávamos sentindo, vendo os nossos parcos direitos virarem moeda de troca na queda de braços entre os poderosos de plantão no Congresso Nacional, chegou ao fim. O vômito veio com a força das entranhas que nós sabemos que temos. Sim, estamos nas ruas para gritar ‘nenhum direito a menos!’. Nós existimos, resistimos, e somos sujeitos de nossas vidas e de nossos sonhos.
A primavera feminista é a desautorização popular de toda e qualquer tentativa de negociata com Cunha e seu grupo de direita fundamentalista. Nunca em nosso nome. Nenhum grupo político está autorizado a ceder aos imperativos da bancada BBB para garantir qualquer estabilidade que seja. Queremos que se mantenha no Brasil a institucionalidade duramente conquistada. Estamos vendo no mundo os resultados do destroçamento dos Estados em nome do lucro do capital acobertado pelas guerras santas. Cresce o racismo, a xenofobia, a exploração, a violência e a miséria. Os refugiados na Europa são o testemunho disso. O atentado em Paris também. No Brasil a tragédia anunciada das barragens de mineração em Minas Gerais são a triste denúncia de quanto vale a vida humana para o capital. Em Mariana a luta primeira dos atingidos é pelo direito de enterrar seus mortos e de continuar vivos.
Nós mulheres estamos nas ruas exigindo garantias de um Estado laico. Nossos corpos não podem ser submetidos à preceitos religiosos que não adotamos. A legalização do aborto é, sobretudo, o reconhecimento do Estado à nossa autonomia como pessoas. É também enfrentar o fato de que hoje o aborto não oferece riscos à saúde de quem pode pagar por bom atendimento médico, mesmo que ilegal. É uma luta assumida quase que exclusivamente pelo feminismo. Já é tempo de ouvirmos outras vozes neste coro. Não aguentamos mais ver mulheres pobres e negras morrendo por falta de atendimento.
A primavera das mulheres nas ruas foi plantada duramente em muitos invernos e verões, em muitas rodas de conversa, posts e memes; em muita violência enfrentada, conversa com as amigas, horas de reflexão… Este feminismo popular, negro, jovem e insurgente mostra a vitalidade da consigna que virou botons e camisetas ‘o feminismo é a ideia revolucionária de que as mulheres são gente’. E gente que tem força para mudar os rumos da história. Este ano, na Marcha das Margaridas, esta força veio dos povoados rurais e ocupou as ruas de Brasília com 70 mil mulheres que, num ato simbólico, viraram as costas para o Congresso Nacional, e levantaram suas bandeiras por desenvolvimento sustentável com democracia, justiça, autonomia, igualdade e liberdade. Ali começou a se alterar a correlação de forças polarizada e mais favorável à direita no primeiro semestre. Nesta semana uma nova vai chegar em Brasília. Vamos enegrecer o planalto. É a Marcha das Mulheres Negras contra o racismo, a violência e pelo bem viver. Gritaremos bem alto: ‘Racistas, não passarão! Machistas, não passaram!’. O feminismo está nas ruas denunciando que o modo de vida imposto pelo capitalismo precisa chegar ao fim! Queremos viver em condições dignas, com possibilidades de sonhar e construir um futuro onde a solidariedade seja a marca do cotidiano.
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