A violência não vai nos represar!

“Houve um dia, que eu até sentia medo / Que você chegasse cedo / Pro meu corpo machucar / Mas eu virei o tabuleiro / Este jogo, companheiro /Eu não vou mais aceitar /Nem Pense Em Me Matar”! 

O trecho da música acima é uma forte mensagem de basta! Mulheres de todo o Brasil, organizadas e articuladas em mais de 360 coletivos, movimentos e organizações feministas lançaram a Campanha #NemPenseEmMeMatar, na manhã da última quinta-feira, dia 25 de março, dia que entra para a história do país e dos movimentos sociais como o início do Levante Feminista Contra o Feminicídio, criado para enfrentar o cenário de agravamento dos casos de assassinatos de mulheres brasileiras. A canção, “O Corpo é Meu”, composta por Cris Pereira e interpretada pela artista Fabiana Cozza, é o hino que fortalece a Campanha: “Essa força que eu trago / quem me deu / foram outras mulheres nessa estrada”. 

Assista abaixo o clipe:

Presente em mais de 20 estados do país, o Levante se ergue para enraizar no país inteiro, das capitais aos mais interioranos territórios, chegando nos quilombos, territórios indígenas, periferias, dos grandes centros, do campo, florestas e das águas. O objetivo da Campanha é ampliar o enfrentamento à violência contra as mulheres, em suas diferentes dimensões, mas sobretudo, para estancar o sangue que está sendo derramado todos os dias com o feminicídio de milhares de mulheres. Este grave problema social é uma das expressões da força do patriarcado como um sistema que estrutura as desigualdades entre mulheres e homens. O poder da violência contra as mulheres tem o seu ápice com o feminicídio, o assassinato de mulheres cisgêneras, transgêneras e lésbicas, como traço do ódio patriarcal contra o feminino.

De acordo com dados publicados no Manifesto da Campanha Nacional Contra os Feminicídios no Brasil, no primeiro semestre de 2020, 648 mulheres foram vítimas de feminicídio, sendo que mais da metade dos casos foram contra mulheres negras e periféricas vivendo em situações de extrema desigualdade social, registrando um aumento de 2% em relação ao mesmo período em 2019. A escalada violenta e desumana contra as mulheres tem se intensificado nos últimos anos, especialmente após o golpe de 2016, ganhando contornos cada vez mais cruéis desde a ascensão autoritária imposta pelo governo de Jair Bolsonaro e as forças fundamentalistas que sustentam o seu projeto de morte.   

Além de denunciar o aumento da violência doméstica, do abuso sexual dentro das famílias e dos casos de feminicídio íntimo – cometido por companheiros e familiares das vítimas -, a campanha quer discutir também a elevação dos casos de femincídio político – que é o assassinato e ameaças de morte contra mulheres eleitas para ocupar cargos nos parlamentos por todo o país -, e que na grande maioria são de mulheres negras e periféricas, a exemplo da candidata à prefeitura de Curralinho nas eleições de 2020, cidade do Arquipélago do Marajó (PA), assassinada pelo ex-marido, e da vereadora Marielle Franco, morta à tiros em 2018, crime de motivações políticas e que segue ainda sem solução pela Justiça brasileira.

“Esta campanha começou a partir da reunião de Vilma Reis, Márcia Tiburi e Tânia Palma, três mulheres militantes e que são referência no movimento feminista brasileiro. A partir delas mais e mais mulheres foram chegando e o número de ativistas engajadas foi crescendo e hoje a gente tem dezenas de mulheres que, articuladas com o Levante Nacional, estão também construindo e ampliando a articulação do Levante em seus estados e territórios”, explica Analba Brazão, educadora do SOS Corpo, ativista feminista da Articulação de Mulheres Brasileiras e que tem construído o Levante Feminista desde o início das articulações. 

Mulheres indígenas, negras e trans: alvos preferenciais da atual necropolítica de aniquilação das mulheres

No Manifesto da Campanha, construído à múltiplas mãos, corpos, experiências e vivências em territórios diversos, lançado no dia 12 de março, destaca o aumento dos crimes de ódio contra mulheres indígenas, mulheres negras, mulheres transexuais, lésbicas, militantes de esquerda e defensoras de direitos humanos, de diferentes idades. Ideias e atitudes feminicidas, misóginas ganham proporções desumanas ao reconhecer a impunidade através das omissões do Estado em coibir o avanço do feminicídio, seja pela falta de políticas pública e Leis de proteção às mulheres, seja pela própria atitude de gestores, legisladores e juristas ao reproduzirem estas ideias e atitudes. É também contra o Estado feminicida que o Levante Feminista Nacional se ergue. 

O Manifesto já tem mais de 30 mil assinaturas e segue aberto a adesão. Cliquei no link para assinar e fazer parte dessa luta! >>> https://bit.ly/3rx9iEE

“A Campanha vai muito além de dar visibilidade a este problema social. Nós queremos que as mulheres parem de morrer, de serem mortas ao decidirem sair de um relacionamento abusivo ou que estejam na linha de frente de suas comunidades lutando por melhores condições de vida, que estejam em cargos de poder desafiando a ordem patriarcal em espaços de participação política e institucionais ou ainda, que não sejam negligenciadas e violentadas pelas instâncias de poder do Estado, como o Judiciário. Nós queremos as mulheres vivas”, reforça Analba Brazão.  

O slogan da Campanha, #NemPenseEmMeMatar, está no singular para marcar que a maioria dos feminicídios íntimos ocorre entre um agressor próximo à vítima, mas não é somente esta mulher que morre ao ser assassinada. Morre com ela a família ao redor, suas filhas e filhos, mães, irmãs e irmãos, tias e avós que também sofrem com a perda da vida destas mulheres.  Quem mata uma mulher mata a humanidade, como diz o outro mote da campanha. “Com isso queremos enfatizar que esta é uma luta prioritária para o movimento feminista, mas que dever ser prioritária também para os movimentos sociais. Porque sem as mulheres, não há projeto de futuro, não há democracia”, finalizou Analba.

Veja abaixo como foi o lançamento da Campanha:

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Next Post

Direito à contracepção: uma urgência na Pandemia. O PL 5435/2020 deve ser arquivado!

seg mar 29 , 2021
A luta vale a pena! Agora há pressão interna no Senado para PL ser debatido em comissão antes de ir ao plenário. O principal argumento é de que já existe legislação e normativas suficientes para garantir a saúde das gestantes, o que falta é implementação.