As manifestações de ódio presentes na campanha eleitoral não podem ser menosprezadas pelas pessoas que defendem a democracia. O ódio na disputa política é o caminho do fascismo, segundo o qual o adversário deve ser eliminado. O fascismo nega o debate político de divergências, não confere valor aos procedimentos democráticos e tenta liquidar, simbólica ou fisicamente, aqueles que expressam uma posição política ou um modo de vida que difere da norma hegemônica.
Foi isso que ocorreu no último domingo na praia de Boa Viagem. A extrema direita definiu seus inimigos principais: o sindicalismo da CUT e o movimento feminista. Associou a isso nomes de deputadas e deputados de esquerda, comprometidos com as causas das mulheres, da classe trabalhadora, do povo negro e LGBT. A paródia musical cantada com grande vibração na manifestação pró-Bolsonaro é, infelizmente, apenas um exemplo simbólico do projeto de país que este candidato defende.
Ele expressa o racismo e a misoginia extremada, afirma com tranquilidade seu ódio aos LGBTs, defende a prática de tortura e, certamente, se eleito manterá as políticas de segurança que produzem o genocídio da juventude negra. Além disso, em 27 anos no parlamento, este candidato não aprovou nenhum projeto em benefício das pessoas e ficou famoso por dedicar seu voto pelo impedimento da presidenta Dilma ao torturador Brilhante Ustra.
Estas breves informações já demonstram que a paródia musical foi apenas um símbolo do fascismo que o candidato defende. Neste sentido, os animados de boa viagem estão certos: o movimento feminista realmente é seu inimigo. Para nós, que construímos junto com muitas outras mulheres o movimento feminista no Brasil, este é o lado certo para estar neste momento: o lado da esquerda.
Nós, mulheres, especialmente as mulheres trabalhadoras, negras e periféricas, lutamos cotidianamente pra criar nossos filhos, contamos muitas vezes com o apoio das avós deles e quase nunca dos pais. Nós todas temos direito de viver a vida com liberdade, de ter nosso corpo como possibilidade de expressão de nossos desejos e de nosso modo de vida, de termos trabalho com direitos garantidos e com salários iguais aos dos homens. Tudo isso vai contra o discurso fascista desta candidatura defendida pelas poucas centenas de pessoas que desfilavam na “Marcha da Família com Bolsonaro”, realizada na avenida Boa Viagem, último domingo (23).
A música, símbolo da campanha, é usada como instrumento de disseminação de ódio fascista e representa uma ameaça à democracia. Representa ódio machista, que se direciona com mais força às mulheres feministas, mas também à população negra e LGBT, ódio de classe, que se direciona àqueles que trabalham, estão organizados em sindicatos e resistem à regressão de direitos nas ruas. Analisada a fundo, a música demonstra ódio à democracia. Ela rebaixa o nível do debate político, visto que não faz o debate entre ideias, conceitos e programas, mas extingue o discurso na pretensão de aniquilar os sujeitos políticos contrários, com o intuito de eliminar ideias e indivíduos. Eis a política fascista clássica.
A música brada um xingamento de baixo nível aos sujeitos e coletivos nos quais reconhecem como exemplo da força política desses movimentos que estão nas ruas com grande firmeza desde antes do golpe de 2016. Estamos lutando por direitos e contra o golpe parlamentar que amplificou a onda conservadora no país e gerou as condições para proliferação do discurso de ódio e implantação das políticas neoliberais que estão entregando os bens comuns, as riquezas do Brasil nas mãos de grandes corporações mundiais. A candidatura em questão está alinhada com esta agenda, mas este programa foi derrotado nas últimas eleições, e será novamente em 2018.
O feminismo luta por uma democracia radical, diferente desta suposta democracia que privilegia uma classe dominante de pouquíssimos homens brancos empresários, banqueiros, ruralistas, mineradores e políticos de direita. No Brasil, nós mulheres somos mais de 54% da população nacional. Nas pesquisas eleitorais está demonstrado que sabemos o que queremos pra nossas vidas. A candidatura à presidência com maior índice de rejeição entre as mulheres é, obviamente, esta que tem estimulado o ódio.
Somos um movimento forte que cresce a cada dia. Esses ataques não nos intimidam. Estamos mostrando que nós, mulheres conscientes de nossos direitos, podemos ser uma força política neste pais. Somos milhões e com a força deste movimento decidiremos as eleições. Mas não vamos parar por aí. Seguiremos na luta para anular as medidas do golpe, repudiar a sua política que não foi aprovada pelo povo e construir um pais melhor para vivermos e seguirmos construindo a nossa autonomia e liberdade.
O ódio deles é o recalque por estarem perdendo, aos poucos, o poder patriarcal que durante milênios comandou o mundo. O movimento feminista, o movimento negro, o sindicalismo urbano e rural, o movimento LGBT, quilombola, indígena, o movimento dos sem teto, dos sem terra, todos os outros movimentos organizados no campo, nas cidades, nas florestas, nas águas e, ainda, os movimentos que estão se organizando e por se organizar estarão nas ruas combatendo o discurso de ódio que tenta se apoderar do Brasil e entregar nossos bens comuns às mega corporações mundiais.
Nós mulheres estaremos nas ruas dia 29 de setembro em todo o Brasil contra Bolsonaro e contra o fascismo que ele representa. E, antes, no dia 28 em toda a América Latina estaremos em mobilização pelos nossos direitos, exigindo a legalização do aborto e o atendimento das mulheres que necessitam no sistema público de saúde. Seguimos firmes: Tudo sobre nós, nós mesmas decidimos!